Thursday, February 28, 2008

Consciencia limpa

A coleta seletiva de lixo na Irlanda funciona. Estabelecimentos comerciais e residencias seguem a risca. Nos pubs onde trabalho, por exemplo, as garrafas sao descartadas por cor, separadamente. Num dos bares ha, inclusive, uma prensa para papeloes. Latas vao em sacolas distintas. Nas casas, o lixo da cozinha, o do jardim e os materiais reciclaveis tem, cada um, sacolas especificas. A coleta residencial eh feita uma vez por semana. Para isso, os sacos podem ser colocados dentro de lixeiras de plastico - compradas no orgao municipal responsavel - ou diretamente na calcada - aih sao necessarias etiquetas, compradas no “Post Office” ou em lojas de conveniencia. Em longo prazo, o custo-beneficio dos recipientes plasticos eh melhor. E os lixeiros tambem devem preferi-los. Os caminhoes tem um sistema em quem basta encaixar a lixeira numa alavanca e acionar um botao, e a tecnologia se encarrega de vira-la e despejar o conteudo. Tudo com muita calma (talvez seja por isso que a maioria dos lixeiros que vi aqui sao gordos. Os lixeiros brasileiros sao atletas!).

Na regiao onde moro, ha um local especifico para as pessoas depositarem os materiais reciclaveis. Ele serve para residentes de pequenas ruas onde o “caminhao verde” nao passa. E tambem para descartes nao muito usuais, como de computadores e sofas, por exemplo. Esse local possui varios conteiners, especificos para cada material - plastico, papel, oleo de cozinha, lampadas, etc. A entrada no patio para o descarte dos residuos deve ser feita de carro. O valor cobrado depende do tamanho do veiculo. O minimo sao 7 euros e o maximo, 30. No curto tempo em que estive lah - cerca de vinte minutos - presenciei o engajamento dos cidadaos daqui com a causa da reciclagem. Pessoas chegando a todo o momento, abrindo os porta-malas dos carros e colocando cada material em seu devido conteiner. O proprio cidadao fazendo a destinacao adequada do lixo reciclavel que produziu.

Por consequencia, os lagos, rios e ruas daqui impressionam pela limpeza. Dia desses, as criancas das quais cuido (um menino de sete anos e uma menina de nove) foram comprar figurinhas de jogador de futebol para completar os seus albuns de times Inglaterra. A euforia era grande. Por impeto, rasgariam os pacote e nem se importariam com a embalagem, e sim somente em ver quais eram os jogadores dessa vez. Mas nem a ansiedade fez com que as criancas jogassem no chao o primeiro filete que rasgaram. Um pedaco de papel minusculo fez com que o menino despertasse da fixacao pelo envelope e comecasse a olhar em volta, tentando encontrar uma lixeira. Pedi para que dessem os papeis para mim, colocaria no bolso e depois, em casa, no lixo. Fiquei impressionada. Obviamente que colocar lixo na lixeira nao eh uma atitude incomum. Mas, vindo de criancas, num momento em que soh o que importava a elas no mundo era ver logo as figuras, eh um gesto que chama a atencao.

Um outro dia, brincando no parque, a menina ficou furiosa com o irmao por ele ter deixado cair um papel de bala no lago impecavel que ha no lugar. Ela disse que poderiam ser multados em 200 euros por isso. Ficou brava mesmo. Deu pena do menino, olhando arrependido o papel indo com a agua. Tambem fiquei chateada - o tal papel era pequeno, mas naquele lago tao limpo, chegou a crescer. Deu remorso de causar sujeira a uma agua tao conservada.

Thursday, February 21, 2008

A primeira viagem

Do aeroporto a hospedagem estudantil, no carro sujo de um indiano cinquentao, que falava sem parar, fervoroso a Virgem Maria, eu sabia pouco do que estava por conhecer. Mas a sensacao de inseguranca era soh com o transito em mao contraria - parecia que a qualquer momento iamos bater em alguem. O entusiasmo com o mundo novo em que estava chegando era imensamente maior. Qualquer medo ficou pequeno, tal qual as janelas do carro, diante do olhar curioso a desvendar Dublin - uma cidade com cerca de 1 milhao e 600 mil habitantes, capital da Irlanda, pais destino de todo o vento e chuva que vem para Europa.

As primeiras impressoes chamaram a muito a atencao. Os carros estacionados na contramao e na calcada, a predominancia das casas emendadas e praticamente iguais... O unico edificio do trajeto passa com um alerta do motorista: “nao cruze por aqui sozinha a noite, eh uma zona perigosa”. Eh… pensando bem, nem tudo eh tao diferente.
Depois de meia hora, deixei o carro e a tagarelice do indiano em frente a uma das tantas casas emendadas, estusiasmada pelo tudo novo em que acabara de chegar. E, aos poucos, eh deste mundo que falarei neste blog. Sem pretensao alguma e sem acentos e afins. Apenas com a intensao de contar algumas historias, sem circunflexos, agudos, crases, cedilhas, tils. O teclado ingles me limita.

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Passados quatro meses, ja sei que para se chegar em casa tranquilamente basta nao andar sozinha de madrugada e ignorar as provocacoes de jovens arruaceiros. Ouvi de muitos brasileiros - e concordo: o melhor de tudo aqui eh a seguranca com que se anda pelas ruas. Mesmo assim, claro que evitamos os tais predios. Em media de 5 andares, eles existem em varias partes de Dublin. Sao moradias providas pelo governo para irlandeses pobres, com um ressalva ao ultimo adjetivo. Pobre aqui eh quem ganha em media mil euros por mes. Nao passa fome, nao passa frio, tem otimos apartamentos onde morar. Segundo meu professor de ingles, esta eh a populacao de risco do pais. Dela, vem alta taxa de criminalidade. Os jovens, sempre usando roupas de moletom e tenis brancos, com o apelido pejorativo de nackers, fazem baderna pelas ruas e roubos em estabelecimentos comerciais (nada de assaltos a mao armada, nao chega a tanto. No geral, sao ladroes de prateleiras). Sao barrados por segurancas em shoppings e bares (sim, eles respeitam segurancas e policiais, que trabalham desarmados) e causam medo aos imigrantes. Ha muitas historias de agressoes a poloneses, indianos, brasileiros, chineses, etc (mas crimes graves sao raros). Observando os parenteses, portanto, ve-se que o perigo mora longe. Aqui, a seguranca do ir e vir eh sedutora.